*Por Ibaneis Rocha – Governador do Distrito Federal
Há exatamente um ano, partia sem aviso prévio Paulo Pestana, um jornalista que marcou não apenas as redações de Brasília, mas também o coração de todos que tiveram a sorte de conhecê-lo. Sua ausência foi um golpe duro, especialmente porque Paulinho, como era carinhosamente chamado, sempre viveu com uma intensidade que fazia parecer que ele estaria ali para sempre, observando, orientando e inspirando.
Paulinho sempre foi um jornalista diferenciado. Trabalhou em quase todas as redações de Brasília, deixando em cada uma delas um rastro de profissionalismo, de ética e humanidade. Sua carreira foi construída com dedicação e um olhar apurado para os detalhes, características que o tornaram uma referência no meio. Contam-se histórias dignas de um registro permanente de sua passagem no jornalismo — como repórter e editor. Seus laços com a cultura levaram-no a promover artistas em início de carreira. Seu lado boêmio deixa saudades nos bares (preferencialmente botecos) que frequentou para discutir de futebol a política. Podia ser qualquer outro assunto, mas continuava sendo a mesma pessoa, afável e até amorosa; irônico, às vezes, sem perder a doçura. Grosseiro, jamais. Não admira a legião de admiradores, colegas que respeitavam não apenas seu talento, mas também sua integridade.
Mas o Paulinho jornalista era apenas uma das facetas desse homem tão singular. Logo surgiria o estrategista, o articulador político, aquele que, com sua fala mansa, seu humor refinado e sua capacidade única de convencer as pessoas, conquistou políticos de todos os espectros. Não conheço um político do Distrito Federal que não tenha se rendido aos seus encantos. E ele poderia ter trabalhado com qualquer um, mas escolheu ficar ao meu lado, mesmo quando tudo indicava que a disputa política em 2018
seria acirrada e desafiadora.
“Calma que vamos chegar lá”, ele repetia, sempre com a serenidade de quem enxergava além do imediato. E foi assim, com essa calma e determinação, que Paulinho não apenas moldou a imagem do candidato, mas também muito contribuiu para tecer alianças que foram fundamentais para a campanha. Ele era o maestro por trás dos bastidores, aquele que transformava desafios em oportunidades e dúvidas, em certezas.
Lembro-me vividamente de um dia, no início da campanha, quando um eleitor nordestino me presenteou com um chapéu de couro. Eu o coloquei na cabeça, sem pensar muito, até que Paulinho me olhou com aquele brilho nos olhos e disse: “Não tire esse chapéu. Vai ser o símbolo da campanha”. E explicou, com a clareza que só ele tinha, que aquele chapéu representava mais do que um acessório; era um tributo aos trabalhadores nordestinos que ajudaram a construir Brasília e um reconhecimento do sotaque nordestino que permeia o falar brasiliense. Sua habilidade de observar detalhes, tanto na comunicação quanto na apresentação pessoal, era notável. Ele oferecia feedbacks gentis, que se transformavam em lições valiosas.
Aquele chapéu tornou-se, de fato, um símbolo. Eu o guardo até hoje, não apenas como uma lembrança da campanha, mas como uma memória viva de Paulinho e de sua genialidade.
O legado de Paulo Pestana nos convida a refletir sobre como podemos honrar sua memória. Há uma pequena praça sendo construída com o seu nome ao lado da Quituart, no Lago Norte, local onde ele frequentava nos fins de semana, reunindo dezenas de amigos em torno de sua mesa. Talvez ele recusasse essa homenagem. Desta vez, vamos discordar. Em tempos em que os heróis parecem ser esquecidos, é vital que seus ensinamentos permaneçam vivos.
Trata-se de um amigo verdadeiro, daqueles que raramente encontramos na vida. Sua amizade era como um porto seguro, um lugar onde eu podia ser eu mesmo, sem medo de julgamentos. Ele tinha uma maneira única de me entender, de saber quando eu precisava de um conselho, de um incentivo ou apenas de um momento de silêncio compartilhado.
Nossa amizade foi forjada nos pequenos gestos e grandes significados. Era no jeito como ele me olhava, com aquele sorriso tranquilo, quando sabia que eu estava prestes a tomar uma decisão difícil. Era na forma como ele me puxava de volta à realidade quando eu começava a voar alto demais, sempre com uma piada no momento certo. Era na maneira como ele celebrava minhas vitórias como se fossem dele, e como ele me apoiava nos momentos de derrota, sem nunca deixar que eu desistisse.
Paulinho tinha uma capacidade incrível de transformar o ordinário em extraordinário. Um simples café na esquina virava uma conversa profunda sobre vida, política e sonhos. Um passeio pelo Plano Piloto era uma aula de história e de amor por Brasília. Ele me ensinou a ver beleza nas coisas simples, a valorizar as pessoas e a acreditar que, mesmo nos momentos mais difíceis, há sempre uma luz no fim do túnel.
Sua partida deixou um vazio que não pode ser preenchido. Há dias em que ainda espero ouvir sua voz ao telefone, dando aquela dica certeira. Há momentos em que sinto falta daqueles olhos brilhantes, cheios de sabedoria e compaixão. Mas, ao mesmo tempo, sinto que ele ainda está aqui, em cada decisão que tomo, em cada desafio que enfrento, em cada sonho que persigo.
Paulo Pestana era mais do que um jornalista ou um estrategista político. Era um homem que sabia valorizar as pessoas, que enxergava beleza nos detalhes e que transformava ideias em realidade. Ele nos lembra que os grandes sonhos e os grandes desejos foram feitos para permanecer intocados em nossas almas, como faróis que guiam nossos passos. Viveu com honra, com paixão e com um amor genuíno pelas pessoas e por Brasília, que adotou como sua terra.
Paulinho, agora, é mais do que uma lembrança. É um chamado para que não nos esqueçamos daquilo que realmente importa: viver com propósito, amar com intensidade e deixar um legado que inspire as gerações futuras. Sua luz continua a brilhar em todos nós.
Transcrito do Jornal Correio Braziliense edição de terça-feira, 11 de março de 2025 • Opinião • Pag 11 | Foto: Renato Alves/Agência Brasília